segunda-feira, 30 de maio de 2011

Desopilar.

É incrível como você vive me salvando de mim mesma.
Ontem, você sabe, você estava comigo, deu tudo errado e eu fiquei emputecida com isso. - Você estava ali, recebendo o meu mau humor pela caixa dos peitos, com um sorriso complacente plantado no rosto e dessa forma, jogando por terra toda a minha acidez.
Você sabe como eu sou metódica quando resolvo planejar algo, e sabe o quanto eu me transformo num serzinho rabugento quando as coisas saem da linha. Mas você estava ali, com sua postura indefectível, como se portasse toda a paciência do mundo nos bolsos e o tempo lhe fosse nada menos, que um moleque obediente.
Por Deus, como você possui destreza com as trivialidades ao seu redor! Estes pequenos incidentes te enfeitam, contribuem com seu charme, com seu ar cosmopolita de mestre do dia-a-dia. Toda a contrariedade que lhe cai sob os ombros parece ser oportuna, já que ressalta o seu não-abatimento, o seu jeito de sair triunfante do caos. De rir dele.
Olha, eu juro que amanhã, que outro dia qualquer em que a gente esteja feito gato e rato, eu faço uma lista com todos os seus tantos defeitos irritantes, desconcertantes e mortais. Mas hoje, deixa eu te curtir, te paparicar, me deixa fazer o meu famoso draminha homérico a seu favor.
Ontem, como eu disse, tudo deu errado e ainda sim, você me fez brindar a minha mini-xícara de café com seu copo de cerveja. Quem mais brindaria cerveja com café, em pleno mundo desabando em desordem?
Você disse que deveríamos fazer uma crônica sobre esse nosso momento de brindes atípicos e a gente caiu na gargalhada. 
Sei que no fim, eu já estava com a língua solta, confessando os meus devaneios em me tornar uma cineasta de filmes românticos, afrouxando o laço do meu vestido e respirando do seu ar contagiante. E agora, olha só: aqui estou. Não sei se pelo efeito “devastador” da cafeína ou se de suas sugestões certeiras, mas, escrevendo as nossas sagas de madrugada.
O fato é que eu tinha, eu tinha que destacar a sua importância na minha vida. O seu poder de sacudir minha poeira, de desfazer minha carranca. Gosto também do seu modo de me fazer acreditar que sou uma mulher especial e segundo suas palavras, propriamente sofisticada.
Há tanta mediocridade por essas estradas, tanta 'puxação de tapete', que ao saber que conto com almas genuinamente nobres, sou ocasionada por uma série de suspiros aliviados; por uma alegria incontida no peito.
Obrigada por existir. E não o bastante, por dar ênfase a minha existência.

sábado, 28 de maio de 2011

Todo o sentimento.

Ele me lê como ninguém e me faz abusar duma pretensão doce, por desejar ter escrito os seus escritos. - Chico. Grande Chico Buarque. 
Hoje deixo que ele fale por mim.
-
Preciso não dormir
Até se consumar
O tempo
Da gente
Preciso conduzir
Um tempo de te amar
Te amando devagar
E urgentemente
Pretendo descobrir
No último momento
Um tempo que refaz o que desfez
Que recolhe todo o sentimento
E bota no corpo uma outra vez

Prometo te querer
Até o amor cair
Doente
Doente
Prefiro então partir
A tempo de poder
A gente se desvencilhar da gente
Depois de te perder
Te encontro, com certeza
Talvez num tempo da delicadeza
Onde não diremos nada
Nada aconteceu
Apenas seguirei, como encantado
Ao lado teu.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Da cor do pecado.

Hoje eu não tenho look. Estou farta! 
Poupe-me da moda e grife da temporada. Meu cabelo está desgrenhado e na minha boca, grita um batom vermelho. Minhas unhas estão roídas e de sobreaviso: hoje eu não aceito conselho!
Tudo o que eu preciso é de um café amargo; espalhar as folhas do meu diário ao vento. Quero na minha essência desprendida mergulhar, voar em forma de versos e palavras. - Me libertar.
Hoje eu quero pintar a tristeza de palhaça, fazer graça da desgraça. Quero dizer absurdos sem dó nem culpa, me despir diante de um espelho para me autoconhecer. Veja bem, hoje eu acordei azeda, sem sorriso “de grátis” pra oferecer. E por gentileza, não me venha com panos frios. Nunca lhe disse que não se esfria um corpo que já nasceu febril?
Vou é ler de novo “A arte da guerra”, virar fatal. Bancar a estrategista e aniquilar meus inimigos com um olhar de viés mortal.
Hoje eu te atordoaria com meus segredos sujos, jogaria a descrição na lata do lixo, mancharia o seu nome e faria da tua vida, um comício. 
Agora sim! Você iria querer fugir, me odiar, me repudiar. Depois me amar, me desejar e me abençoar... Que eu sei que você bem que gosta, quando o tal do meu "Id" resolve imperar.
Meu amor, preste atenção. É clichê ser belo, cheiroso e equilibrado. Quero ver mesmo é se você tem cacife, pra ser maldito e desvairado.



segunda-feira, 23 de maio de 2011

De fora pra dentro.

Existe uma história, - uma bela história - a qual eu não consigo escrever. 
Passá-la inteira para o papel, tornou-se um conflito em constante rota de colisão comigo. Ainda que, a cada vez que me arriscava, a eloqüência falhava e qualquer frase que pudesse descrever uma situação, soava como no mínimo grosseira. Simplesmente nada cabia ou se encaixava. 
De antemão, falo de uma história e não, estória. Dessas mesmo, que fazem a gente querer ouvir ao pé do fogo estalante de uma lareira. Ou dessas que ressuscitam o nosso espírito, muitas vezes já mortificado pela falta nobreza entre as pessoas, que há muito não dá o ar da graça. 
Sei que havia o desejo de deixá-la gravada em qualquer coisa que fosse, mas o desejar também já não era o bastante. Eu não passava sequer da sexta linha, permanecia travada; emperrada literalmente... Até ontem.
Foi enquanto conversava com quem teimou de virar protagonista dessa minha "trama", que acabei confessando o que andou importunando-me esses dias. - E ele disse: “A versão do papel estaria ali, mas ela jamais seria fiel ao que você realmente sente. Há coisas que não podem mesmo ser transcritas. Elas são exclusivas de nós.” 
Simples, até óbvio... Porém, não menos importante, me caiu como luva.
Quando a gente cultiva esse hábito, o de escrever, - eu pelo menos – sou tomada por uma ânsia que me faria beber o mundo em um gole só. Desmascararia o sentimento, lhe daria forma, cor, cheiro, face... Escrever não é senão, a própria tentativa de costurar a alma numa folha de papel ou no branco convidativo da tela do computador. Entretanto, em meio aos nossos bagulhos internos, convém preservar o que nos há de peculiar. Filtrar. Não violar o que não quer ser violado. 
Fui hasteando a bandeira branca por fim. Não tenho um catálogo completo destas emoções, é verdade. Mas ainda as tenho. 
Sosseguei, portanto. Sem caneta, dedos batendo insistentemente nas mesmas teclas e sem a minha história redigida. Contudo, ainda podia gozar do que, por seus instantes únicos, conseguiu tornar-se justamente o melhor do oposto: Indescritível.



domingo, 15 de maio de 2011

Desperta a Dor.

Eu hoje tive um sonho e levantei atenta, não sei se a tempo.
Garganta seca, marcas de unhas cravadas na palma da mão, coração acelerado e miúdo, miudinho.
A vontade de retornar aos lençóis me arrastava pelos cabelos e a sensação de desnorteio: “Será que foi real?” em mim, instalou-se.
Mais previsível não poderia ser, quando olhando pelas frestas da cortina enxerguei apenas uma confusão cinza. Chovia! Chovia muito e pela primeira vez, me vi desejando o som dos gritos finos e satisfeitos das crianças brincando no parque, da britadeira incômoda de uma eterna reforma na casa ao lado e dos carros buzinando pelo imediatismo de todo o dia. É isso. Queria algum barulho atroador mesmo; pra me tirar o sufoco dum silêncio duvidoso e indecifrável. Queria um punhado de sol e luz. Queria era tomar um porre de realidade. 
Mas a vida tava arisca, não queria urgir não. Amanheceu fria, impessoal, com tudo fora do ar. - Eu estava fora do ar. - Com o peito congelado por um temor medonho e estremecido por uma vontade voraz.
Apenas os pedaços do que vi dormindo, foi que passaram feito clarão na mente. Me fazendo doer uma saudade sóbria e latente, de um tempo que apesar de presente, - sapateando o meu capricho - não podia ser agora. Não podia ser urgente.



sábado, 14 de maio de 2011

Retificando.

" Eles me rotularam, me analisaram, jogaram mil complexos em cima de mim; problemas, introjeções, fugas, neuroses, recalques, traumas..."

A que diagnóstico chegou-se? Digo eu.
A minha fumaça da verdade, é inversamente proporcional ao que os senhores doutores querem (ou conseguem) tragar.


sexta-feira, 13 de maio de 2011

Liberdade Carrossel.

Quanta indelicadeza a sua, amor
Colocar ponto final em nosso enredo tão bonito
Eu, com o peito cheio de desesperança, chorei feito criança
Teimando em colocar vírgulas após tudo ter feito e dito

Você, todo pomposo
Montou em seu cavalo alado e logo partiu
Deixando-me na sacada, com o avesso da risada
A maldizer todo o desfastio
Mas veja só como a vida é engraçada
Após toda essa papelada
Eis que um andarilho surgiu

Colocou minhas tralhas na sacola
O meu luto jogou fora
E mostrou-me sentimentos mil

E você, que agora me lê
Atente bem para uma séria questão
Enquanto o mundo se abria frente aos meus olhos
Volta-me o tal moço, ‘desfolhador’ de coração
Já com a alma sem emendas, nem espinho de flor
Digo-lhe então, com toda a sinceridade e ardor

Eu que acreditava em pontos e vírgulas
Hoje vejo que este mundaréu é reticente
Logo, tomas teu rumo, seu moço e como eu, olha pra frente
E se ainda permitir, dar-te-ei um conselho de gente:
Acautela-te ao montares em cavalos com asas
Pois estes só existem mesmo em carrossel

E junto a uma doce canção
O convidarão a rodar o mundo em cima de um corcel
Você girará até ficar tonto
E os rostos ao seu redor desalinharão
Gozará de uma liberdade infantil
Sem responsabilidade, só distração

Mas fantasias também são traiçoeiras
E as fichas do seu brinquedo hão de acabar 
E quando desceres desta falsa roda viva, darás conta
Jamais saístes do lugar.

Contrastes.




- Claro ou escuro?
- Como?
- Esmalte. Claro ou escuro?
- Ah... Escuro. Vermelho escuro.

Fiquei observando aquela moça com ares de desgosto, remexer no seu carrinho de esmaltes. - Rosa pink, rosa bebê, cinza, cintilante, laranja... Aquele carnaval de cores parecia fazer um contraste perfeito com a máscara triste que a mulher pregara no rosto.
Será que ela tinha filhos? Se sim, quantos filhos tivera? Será que vivia só? Ou mesmo ninguém tinha por ela? Será o quê...? "Claro ou escuro?" A pergunta que lhe cabia todo o santo dia. Dando forma as unhas roídas, colorindo mãos de madames... E as dela, quem cuidava?
Olhei para elas, suas mãos. Estavam pintadas de um “rebu” descascado e a palma, com resquícios de tinta. – “Ossos do ofício”, pensei.
Levantei os dedos e dei uma espiada nas minhas unhas já finalizadas. 

- Você trabalha bem.
Disse eu, numa tentativa de estimular o seu bom humor.
Ela nada disse; nada esboçou. Talvez ouvisse mal.
- Gostei das unhas, ficaram ótimas.
Repeti mais alto, não deixando de achar-me inconveniente.
Ela deu um sorriso chocho e logo voltou a pendurar sua tristeza no rosto.

Me senti um tanto frívola. Estava ali, no meio de um salão, pintando unhas e criando hipóteses sobre as máscaras alheias. 
No frigir dos ovos, talvez ela só estivesse num dia ruim. Talvez fosse mesmo melancólica ou quem sabe, até mais feliz que eu. 
Não sei... Quem poderia cerrar o punho com a verdade nas mãos? 
A única certeza que conseguiu acompanhar-me porta a fora, era a de que a absoluta constância é mesmo a inconstância dos dias. Ora voamos em azul-céu, ora pisamos em chumbo de asfalto quente. Daí, em meio a estas desventuras, acabamos por fazer isso mesmo: jogando um vermelho, um rosa, um verde; na unha, na cara, no cabelo, na parede do quarto... Tudo para que não fiquemos vivendo um xadrez; preto no branco. Tudo para que fujamos à essência bruta da vida.
Todo o abrir de olhos é bem-vindo porque nos faz perceber as diferentes nuances das cores. E o pior do avesso é o tempo passar, a visão turvar e corrermos o risco de enxergarmos unicamente os seus tons. 
Claro ou escuro.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Clara Clarice.

                                            Foto: opperaa.com
Os livros de Clarice Lispector curiosamente são alguns dos quais eu mais demoro em ler. A cada parágrafo, sou obrigada a fazer uma pausa digestiva para ter certeza de que todas as informações foram devidamente mastigadas. Tenho que sorver cada gole, tamanha é a verdade contida em suas doses; em suas frases. 
Pauso sim, não por conta de qualquer linguagem pesada, robusta ou mesmo incompreensível, mas pela quantidade absurda de realidade. Realidade que às vezes sequer enxergamos, passamos em vão. 
Sua metáfora é natural, sua poesia é poeta e prática, os seus excessos são inundados e enxutos. Sua escrita é tão sem esforço e corrente, como água caindo torneira abaixo. 
Ela não era ser, era estar. Não escrevia alheio, escrevia ela e suas tantas versões. Ou melhor, não escrevia... Materializava-se duas vezes.

Que me resta dizer? Bendita demasia de clareza, Clarice!




sábado, 7 de maio de 2011

O Blogue.

Minha tela, plena de mim. Plena de um plural que existe em tudo o que há em nós. Dos desassossegos às calmarias, dos contentamentos às desditas. Falo dessa dualidade infinita que, irascível, impregnou-se na condição do ser humano. Onde todos os sentimentos desordenados bailam conforme a música de um só corpo; onde toda a tempestade chove em um só copo. Toda essa adorável ambigüidade que nos permite ser tudo e nada; lobos e lebres; caçador e caça. Tornar-se refém de um extremo ou de outro, é apenas questão da sensibilidade de escolha. Afinal, cada dia será sempre um novo tempo inaugurando-se, abarrotado de novas possibilidades e de trajes diferentes para vestir os nossos mesmos (e inúmeros) personagens. Ou facetas, ou nuances... Como quiserem! A questão é que é inegável a veracidade do fato de que somos multi. Multilaterais, multiplicados e multiplicadores, e que em cada instante, em cada ínfimo instante - daquele onde frente aos nossos olhos, uma bailarina congela no ar, por exemplo - enquanto para alguns, será um simples fragmento de toda uma coreografia, para outros, será todo um momento de plenitude fragmentada.


E você, em qual tela vê o mundo? Plana ou Plena? 

"Open".

Resolvi driblar as contrariedades da vida e me dar ao luxo!


E ponto.