sábado, 27 de agosto de 2011

Sem si.

- Quero ficar sozinha.
As palavras saíram de sua boca sem que ela percebesse que haviam sido pronunciadas. Ouví-las, ressoava como uma incongruência, medida pelo estado de solidão ocasional que a ocupava no momento.
Não havia realmente ninguém ali. Nenhum vestígio, barulho ou qualquer coisa que pudesse indicar alguma outra respiração dividindo o ar daquele metro quadrado. Nada. Nem ainda os risos da criança, peralta, espalhando-se quase ao mesmo tempo entre todos os cômodos da casa, como se por capricho, brincasse de possuir uma onipresença traquina. Feito assim, também nada dele. Amarrotando o lençol da cama, com o notebook apoiado nas pernas e lançando-a um sorriso com os olhos, por cima da tela e dos óculos grau 0,25.
Ela adorava curtir a ausência de movimento... mas querer estar só nem sempre é sinônimo de precisá-la. Necessidade de abster-se, também é o mesmo que pedir para se esvaziar um pouco; esvair-se dos tantos pensamentos e preocupações que assolam todo o dia.
Querer estar só, às vezes, nada mais é do que querer estar perto de tudo e longe de ninguém, senão, de si.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Todo carnaval tem seu fim.

Ter consciência do momento em que se deve entrar em cena, é tão importante quanto saber a hora em que dela, se retira. - Há cada segundo venho percebendo que este sutil discernimento, é ainda mais raro do que eu posso supor. É até uma questão de finness, eu diria.
Ser alegre e persuasivo é ótimo, mas a boca eventualmente fechada preserva um charme quase que necessário para todo - veja bem, eu disse todo - o ser humano. Um circo não é feito apenas de cores e palhaços, logo, saiba diversificar o seu. E se não souber como diversificar o show... ora, então diversifique de público! Afinal, para alguns, a repetição soa nada mais que a falta de conteúdo. Para outros, beira nada menos que a inconveniência.
Se quiser fazer um bom favor a si mesmo: saiba a hora de parar. Atente para o momento em devem-se fechar as cortinas, porque cá entre nós... a última impressão é tão crucial quanto a primeira.



sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Ops!

Pensar. 
De repente você dá um "stop" na vida externa e depois se dá conta, de que o seu olhar havia pousado na estampa do sofá da sala, que na realidade, você sequer enxergava. Em seguida, caindo em si novamente, percebe que na sua face estava congelada uma nítida expressão: de medo, desaprovação, asco, dúvida, um riso... 
O pensamento que você produzia, lentamente moldava a forma que assumia o seu rosto, como argila.  
A verdade é que não há como mentir para si, em uma hora dessas. 
A gente vive tentando se enganar a todo o tempo, a todo o momento, mas num desses instantes - onde nos flagramos esboçando um sorriso desarmado, por algo que em outras circunstâncias até maldiríamos - é que a gente se entrega, se denuncia.


terça-feira, 16 de agosto de 2011

Não enche!

Vai de ré, que o meu sangue é bom. 
O seu vodu, em minha casa não tem vez. Com o seu batuque, tijolo nenhum da minha estrutura estremece. Na terra onde tu rastejas, eu piso. Da poeira que tu comes, se eu respiro, logo espirro.
Minha fé é nobre. Tua artimanha, pobre.
-

(Não Enche - Caetano Veloso)

Me larga, não enche
Você não entende nada
E eu não vou te fazer entender

Me encara, de frente!
É que você nunca quis ver
Não vai querer, nem vai ver
Meu lado, meu jeito
O que eu herdei de minha gente
Eu nunca posso perder
Me larga, não enche
Me deixa viver, me deixa viver
Me deixa viver, me deixa viver...

Cuidado, oxente!
Está no meu querer
Poder fazer você desabar
Do salto, nem tente
Manter as coisas como estão
Porque não dá, não vai dar

Quadrada! Demente!
A melodia do meu samba
Põe você no lugar
Me larga, não enche
Me deixa cantar, me deixa cantar
Me deixa cantar, me deixa cantar...

Harpia! Aranha!
Sabedoria de rapina
E de enredar, de enredar
Perua! Piranha!
Minha energia é que
Mantém você suspensa no ar
Prá rua! se manda!
Sai do meu sangue
Sanguessuga
 que só sabe sugar
Pirata! Malandra!
Me deixa gozar, me deixa gozar
Me deixa gozar, me deixa gozar...

Vagaba! Vampira!
O velho esquema desmorona
Desta vez pra valer
Tarada! Mesquinha!
Pensa que é a dona
E eu lhe pergunto:
Quem lhe deu tanto axé?

sábado, 13 de agosto de 2011

Lapso.

Quanto mais lindas, mais cruéis. É assim que são as lembranças. 
Sem essa de sorrir porque aconteceu. Sem esse otimismo dissimulado agora, por gentileza. Não dá pra ser desse jeito quando sabemos que a fonte, que tanto alimentou as nossas boas recordações, já cessou.
Não sei ser indiferente a dor da não existência, não sei achar alívio, não sei achar bonito. Me desestrutura, desestrutura a gente essa coisa de ser arrancado da vida. É brusco. É chocante.
Não se exala mais o cheiro, mas o perfume continua na prateleira. Não deixa-se mais rastros, mas o sapato continua ao pé da cama. - Todas as coisas, órfãs, continuam intactas e inúteis, esperando em vão a volta do que já não há. 







quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Estado de graça.

Nesta noite, que já não cabe discordâncias, choros e pratos quebrados, oferecerei lugar a calma. Intuo que ela vem aproximando-se meio avexada, pé ante pé... talvez insegura, por conta de tantas vezes que a espezinhei com minhas agitações e impulsos.
Surpreendentemente, sinto-me extremamente confortável ao poder recebe-la de peito aberto, e, só então dou-me conta de que é porque ela veio acompanhada por uma certeza. A certeza do hoje. 
A convicção-tranquila de que no momento, o agora me bastará.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Construção.

Tenho me dado um pouco mais de espaço. Tenho me resguardado, me analisado... Tenho cuidado de mim. É tempo de aconchegar-me, de tatear minha própria pele. Tempo de colocar os pingos nos “is”, de falar menos e sentir mais. Sentir-me mais.
Passei por dias tensos, e depois de doar cada resquício da minha energia em função de ansiedades extremas, assumidamente egocêntrica é como me encontro. Egoisticamente sem culpa, é como estou. Reabastecendo minha fonte de inspirações, solvendo a essência de cada momento - insaciável -, guardo cada ínfimo detalhe. Estou em processo de montagem, da remontagem do meu próprio quebra-cabeça. Ou da minha síntese, porque não? 
Repagino-me, reciclo-me. Destruo-me e me constituo novamente.
Renovar-me é vital.